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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

DE QUEM É A CULPA?

A crise da água

Pensar em uma vida com pleno bem-estar sem considerar os impactos à natureza reforça a ideia de que os recursos que alimentam o cotidiano nas metrópoles são inesgotáveis. Num mundo globalizado, repleto de informações, interligado por redes, os resultados de inúmeras pesquisas sobre o comportamento dos ecossistemas diante da ação humana ficam geralmente em segundo plano, mas emergem em momentos de crise. Como a luta contra a escassez de água no Estado de São Paulo - e em menor intensidade no Rio de Janeiro e Minas Gerais.  
Antes da crise hídrica se instalar de vez, governantes trataram de tapar o sol com a peneira durante as eleições, apostando na ajuda de São Pedro para encher os reservatórios. As chuvas não caíram na intensidade esperada e não adianta culpar o santo. O problema não é a seca, mas, primeiramente, a falta de um planejamento que englobe variáveis de pressão, sejam as naturais ou aquelas provocadas pela ação do próprio homem. Em segundo lugar, a lógica que domina as relações de consumo de grande parte dos brasileiros. 
A situação da maior região metropolitana da América Latina e uma das mais pujantes capitais mundiais, que sofre com oferta reduzida de água, é exemplo certeiro do comportamento de mercado que domina as relações sociais e encobre o conceito de prosperidade a partir de um viés economicista. 
Mas como essa questão é observada na prática? Vejamos: uma família que vive em um grotão do Brasil consegue comprar uma máquina de lavar a muito custo, tem uma sensação de inserção na modernidade, mas, por outro lado, não possui água encanada ou sequer potável a dezenas de quilômetros. Moral da história: o consumo é uma variável que pode ser agregada à construção do desenvolvimento, mas atualmente reina isolado.
No momento em que a crise impulsiona a educação ambiental para o uso racional da água, uma contracorrente consumista ainda se mostra imune ao problema. Em bairros que abrigam alguns dos moradores mais abastados de São Paulo, é comum ver funcionários limpando calçadas com jato d’água. Sequer os chafarizes de condomínios de luxo foram desligados - o poder de compra cria, digamos assim, uma sensação de tranquilidade. 
Quando se pensa dessa forma, a natureza é colocada na condição de um eterno almoxarifado. Esse possibilita a proposição de ideias mirabolantes, como a transposição de águas do rio Amazonas para acabar com a seca de São Paulo - bastaria verba suficiente para escavar canais de proporções continentais, rasgando o país de Norte a Sul. Convém perguntar: o governador do Amazonas, José Melo (PROS), que apresentou a solução, esquece da maior parte da população amazônica sem água potável nas torneiras.
Essas dicotomias mostram que classes privilegiadas e dominantes - sobretudo os governantes - precisam repensar seus hábitos e conceitos, sob pena de que o cidadão de áreas periféricas do sistema capitalista não possa ter acesso aos benefícios da modernidade. E, mais importante ainda, que o mundo não consiga suportar o ritmo - e não nos faltam exemplos de fadiga da natureza diante de intensiva pressão. Afinal, qual legado pretendemos deixar para o futuro? As cidades não mudam sozinhas. Elas precisam ser repensadas.

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